Neste meu espaço aberto, está exposto um livro incompleto......

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Jun 09

Nasci e cresci um pouco, digo pouco porque foi apenas até aos seis anos, numa pequena aldeia do Alentejo. Como tantas aldeias foi perdendo população e tem hoje pouco mais de 600 habitantes.

Da história, "reza" que nos anos 60, os habitantes, primeiro os homens depois as mulheres e seguidamente as famílias começaram a migrar para outros pontos do país onde a vida lhes era financeiramente mais proveitosa mas não menos árdua. O mesmo aconteceu com os meus progenitores e logicamente comigo, com a família afinal.

Durante décadas as famílias voltavam em alturas festivas, Páscoa, Natal, e no verão por altura das festas anuais. Guardo gratas imagens desses tempos em que um qualquer habitante deslocado, e mais expedito, organizava excursões de lá para cá e o regresso. À chegada eram largados foguetes, o adro da igreja enchia-se das gentes para abraçar os que por ora chegavam.

E era uma festa antes das festas.

Após o sol se pôr, quando as temperaturas eram amenas ou mesmo mais elevadas, era ver as ruas repletas de gente em amena cavaqueira, sentadas à porta de casa, trocando conversas, mesmo de aldeia, de um lado para o outro da rua, ou rua abaixo ou acima.

Nós crianças correndo rua abaixo, rua acima a brincar às escondidas aos "indios e cowboys" a jogar à bola quais "eusébios", marcando golos em balizas definidas por pedras da calçada.

Establecendo o paralelo dir-se-à: "Com tão pouco se contentavam as gentes de então".

Porém o tempo passava célere e chegava o dia de regressar à labuta e aì já não havia fogetes. Havia um mar de gente, um mar igual ao da chegada mas os semblantes como que se transfiguravam, forçava-se o riso e as palavras agora eram de ânimo na esperança de que o tempo passasse depressa para novo reencontro, novas conversas, mesmo que iguais, e para novos foguetes enchessem o céu de luz e troassem como trombetas anunciando boas novas.

E hoje? Agora? Nada é igual, nem poderá jamais ser. Hoje as ruas estão desertas, nem cadeiras nas ruas nem pessoas nelas sentadas.

Hoje impera o silêncio, cada ser humano fecha a sua porta, alguns fecham-se em si próprios.

É triste a minha aldeia, mas é igual a tantas outras.

Continuo a amá-la, continuo teimosamente a regressar, por dias, poucos, por horas algumas vezes e tantas vezes cá venho sem cá estar.   

 

 

 

 

publicado por noitesemfim às 23:34

É triste, mas é a realidade, convívio agora é uma palavra muito limitada, egoísmo e solidão é o que cada vez mais se verifica. As pessoas fecham-se em conchas (sejam elas as suas casas seja o próprio coração), já não se fala com os vizinhos, mal os conhecemos, cada vez mais independentes e autosuficientes e por consequência isolados. Cada vez mais ilhas em nós próprios. Mas parece ser esse o destino da sociedade e combatê-lo talvez não traga mérito!
Eram tempos belos, eu sei, eu também passei por isso, os vizinhos às portas, pela fresca, em alegre cavaqueira ou fazendo queixas da vida, mas a alegria existia em maiores quantidades que nos dias de hoje, vivia-se e festejava-se a vida com um sorriso no rosta (e não era amarelo). :)
Bom fim de semana
Paisagemviva
paisagemviva2 a 12 de Junho de 2009 às 10:15

Obrigado pela visita. São realidades que vamos constatando à medida que os valores se transformam. Poders-à dizer que são melhores, piores mas dada a diversidade de opiniões democráticas eu apenas digo :são diferentes.

Cumprimentos
noitesemfim a 12 de Junho de 2009 às 12:05

Também eu sou uma alentejana que migrou para a região de Lisboa. Durante anos lá trabalhei e apenas vinha alguns dias ao Alentejo, embora poucas vezes à minha terra natal. Veio a aposentação e cá estamos de regresso, engrossando o número dos maiores de 60 anos. Não conhecia a sua terra e fui lá na concretização deste projecto a que me propus que é conhecer melhor o Alentejo e divulgar os aspectos que não se encontram normalmente nos folhetos turísticos. Gostei da simplicidade da fonte e do largo da igreja.
Agradeço a sua visita ao meu blogue.
Cumprimentos
Júlia a 14 de Junho de 2009 às 10:34

Ainda não tive tempo para explorar o seu blog mas confesso que estou curioso. Voltarei por lá por forma a identificar outros lugares que me estão no coração.
Cumprimentos
noitesemfim a 14 de Junho de 2009 às 19:41

Sábias as palavras que escolheu para falar da sua, nossa terra... Os tempos mudam, as gentes alteram os seus modos de viver e pensamentos, mas as raízes permanecem no coração e o desejo de voltar torna-se mais intenso com avançar da idade. Hoje vivo lá e não trocaria por nada as conversas "mesmo de aldeia". A nossa aldeia é linda, pequena, humilde e generosa. Nela estão reflectidas as características dos VAIAMONTENSES
Beijinhos
Aldeã ferrenha a 16 de Setembro de 2009 às 18:41

Bem minha cara conterrânea acabaste de aguçar a minha curiosidade.
Estou convicto de que por ti passarei sem saber quem és mas porque gostas tanto daquele cantinho como eu felicito-te desde já.

Um beijinho
noitesemfim a 17 de Setembro de 2009 às 00:09

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