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A alcova vaga é um vidro escuro através do qual, conscientedele, vejo essa paisagem. . . e essa paisagem conheço-a há muito, e há muito que com essa mulher que desconheço erro, outra realidade, através da irrealidade dela.
Sinto em mim séculos de conhecer aquelas árvores, e aquelas flores e aquelas vias em desvios c aquele ser meu que ali vagueia, antigo e ostensivo ao meu olhar, que o saber que estou nesta alcova veste de penumbras de ver. . .
De vez em quando pela floresta onde de longe me vejo e
sinto, um vento lento varre um fumo, e esse fumo é a visão nítida e escura da alcova em que sou atual destes vagos móveis e reposteiros e do seu torpor de noturna. Depois esse vento passa e torna a ser toda só-ela a paisagem daquele outro mundo...
Outras vezes este quarto estreito é apenas uma cinza de
bruma, no horizonte d'essa terra diversa... E há momentos em que o chão que ali pisamos é esta alcova visível...
Sonho e perco-me, duplo de ser eu e essa mulher. . . Um grande cansaço é um fogo negro que me consome. . . Uma grande ânsia passiva é a vida que me estreita. . .
Ó felicidade baça... O eterno estar no bifurcar dos caminhos! . . . Eu sonho e por detrás da minha atenção sonha comigo alguém. . . E talvez eu não seja senão um sonho desse Alguém que não existe. . .
Lá fora a antemanhã tão longínqua! a floresta tão aqui ante outros olhos meus!
E eu, que longe desta paisagem quase a esqueço, é ao tê-la que tenho saudades d'ela. e é ao percorrê-la que a choro e a ela aspiro. ..
As árvores! as flores! o esconder-se copado dos caminhos!. . .
Passeávamos às vezes, de braço dado, sob os cedros e as olaias, nenhum de nós pensava em viver. A nossa carne era-nos um perfume vago e a nossa vida um eco de som de fonte.
Dávamo-nos as mãos e os nossos olhos perguntavam-se o que seria o ser sensual e o querer realizar em carne a ilusão do amor. ..
No nosso jardim havia flores de todas as belezas. . . rosas de contornos enrolados, lírios de um branco amarelecendo-se, papoulas que seriam ocultas se o seu rubro lhes não espreitasse presença, violetas pouco na margem tufada dos canteiros miosótis mínimos, camélias estéreis de perfume. . . E, pasmados por cima de ervas altas, olhos, os girassóis isolados fitavam-nos grandemente.
Nós roçávamos a alma toda vista pelo frescor visível dos
musgos e tínhamos, ao passar pelas palmeiras, a intuição esguia de outras terras. . . E subia-nos o choro à lembrança, porque nem aqui, ao sermos felizes o éramos. . .
Carvalhos cheios de séculos nodosos faziam tropeçar os nossos pés nos tentáculos mortos das suas raízes. . .
(.......Cont. + tarde......)